Fui criada pra enxergar o mundo como se ele fosse todo cor de rosa. Fui criada pra ver sempre o lado bom das pessoas e, por ter vivido esse tipo de criação, posso afirmar, não é bom achar tudo sempre lindo e que no final vai dar tudo certo, simplesmente porque a vida é linda. Viver assim é fugir da realidade, é confundir otimismo com ilusão.
Apesar de ser uma otimista, de pensar positivo, a vida me ensinou com algumas porradas que é preciso tirar o véu da nossa frente e enxergar o mundo como ele é, sem tons pastel e sem colocar cores mais fortes que as cores da verdade. Não gosto de me iludir e tirar meus pés do chão. Tiro meus pés do chão quando sonho, quando imagino, mas, hoje, aprendi que tirar os pés do chão quando estamos tratando de situações do nosso dia-a-dia, é péssimo. Não dá pra ficar fantasiando e nem mascarando. Não sou daquelas que olham o copo pela metade e o veem quase vazio. Mas também não sou dessas que olham o mesmo copo e o veem quase cheio. Enxergar um copo pela metade como quase cheio é um perigo. Eu enxergo um copo com água pela metade como um copo que está com água pela metade. Mas esse modo de pensar me causa transtornos, às vezes, com relação à amizades.
Sou uma pessoa com alguns bons amigos. Sou cercada de pessoas queridas a quem respeito muito e quero bem e tenho a sorte de ter pessoas bacanas convivendo comigo, a quem posso recorrer em momentos difíceis. Entretanto, há muito deixei de acreditar que TODOS são meus amigos. Aprendi a separar amizade de coleguismo. Não foi fácil pra uma pessoa que sempre quis ser gostada e que em algum ponto da vida achou que seria uma unanimidade, cair em si de que não é bem assim e aceitar que receber um NÃO das pessoas ao redor, não quer dizer que elas não gostem de mim. Simplesmente, não é pessoal.
À medida que fui caindo na real, foi inevitável me tornar uma pessoa com foco na realidade, uma pessoa que lida com o que tem em mãos. No trabalho, não gosto de estabelecer metas impossíveis, frustrantes. Gosto de colocar meu braço onde alcanço e não gosto de enfeitar o pavão. E aí é que está: vejo que a maior parte das pessoas A D O R A "enfeitar o tal do pavão". Jesus disse algumas vezes antes de ser crucificado: "Quem tem ouvidos pra ouvir, ouça." E essa frase diz muito. Pra mim, diz que nem todos nós estamos preparados pra ouvir a verdade. É mais fácil ouvir as palavras que queremos escutar. Quem nunca pediu a opinião sincera de um amigo quando no fundo o que queria ouvir era que a opinião do amigo era a mesma que a sua?
Ter uma amiga que diz a verdade, muitas vezes pode ser uma dor de cabeça. E, não me entendam mal, quem me conhece sabe que sou uma pessoa educada e não sou capaz de indelicadezas ou de magoar as pessoas deliberadamente. Mas não gosto de palavrinhas doces quando o caso é pra palavras duras. Também não quero ser a dona da verdade, longe disso. Mas não aguento pessoas que observam seus amigos tomarem decisões loucas sem nada falar e, mais longe, ainda incentivam dizendo que, no final, vai tudo terminar bem.
Vou exemplificar o que acontece comigo: há pouco tempo uma amiga linda de quem gosto demais fez uma tatuagem insana nas costas. O desenho estava tão feio e borrado que cheguei a pensar que tratava-se de uma tatuagem de henna que estivesse saindo. Várias pessoas olhavam a tatuagem sem conseguir definir que desenho era aquele. Aí começa o que eu chamo de enfeitar o pavão: uns diziam que estava feio porque não estava terminada ainda. Outros diziam que não estava tão bom porque estava recente, depois iria melhorar. E eu? Falei logo que era um absurdo minha amiga, uma mulher linda, ter confiado as costas à um tatuador pra ele fazer uma bobagem daquelas e que ela procurasse outro profissional pra consertar aquele estrago urgentemente. Além de mandar a real, ainda me vi nervosa com toda a situação. Graças a Deus, a tatuagem dela hoje está linda, pois seguiu meu conselho.
Outra amiga minha ficou grávida de uma transa avulsa com um cara que mora em outro estado. Meu Deus. O que dizer? Pra mim, só há um caminho: a realidade. Enquanto eu falei que seria muito duro, que ter um filho com o suporte do marido já é barra pesada, imagina sozinha sem suporte financeiro do pai da criança e, principalmente, sem suporte emocional, todas as outras pessoas romantizaram dizendo que seria uma maravilha ter um bebê, que todos ajudariam a criar, que ela nunca estaria sozinha. Ha, ha, ha. Não preciso nem dizer quem estava com a razão. Eu só queria que ela estivesse preparada para algo muito difícil e que não adianta todo mundo dizer que vai ajudar porque hoje ela está sozinha, tendo que cuidar de uma criança cheia de necessidades, nesse processo solitário e doloroso que é o de ser mãe e pai. Porque ninguém consegue ser mãe e pai. São papéis distintos.
Estou exemplificando pra tentar mostrar que me sinto uma boba por falar as coisas da forma mais próxima da realidade que posso porque nem todo mundo está preparado pra isso. No fundo, a maior parte das pessoas deve achar que eu não devia falar, que no momento em que estamos vivendo uma situação difícil só o que queremos escutar são palavras de consolo e esperança, mas será que a vida é isso mesmo? Será que muitas vezes não é melhor encarar a verdade e partir pra atitudes que possam nos levar, mais na frente, a um desfecho mais feliz, mesmo que doa nesse momento? Vamos agora ficar ouvindo palavras de carinho e sentar no sofá esperando que Deus resolva? Colocar nossa vida totalmente nas mãos da esperança? Nossa vida é nossa vida, está em nossas mãos. E Deus só ajuda a quem sabe onde quer chegar.
Por tudo isso é que fico pensando que o Namorado foi mesmo feito certinho pra mim. Todas as vezes que pergunto a ele se ele me ama pra sempre, pra vida toda, ele me responde: "Namorada, eu te amo hoje. Pra sempre, não posso afirmar." Por mais que eu goste de ouvir essas coisas românticas do tipo "Te amo pra vida inteira" ou "Vou te amar pra sempre", sei que no fundo ele tem toda razão. Não podemos prever o futuro. Lidamos com o agora, com esse momento. E o fato do Namorado ser real comigo, me dizer a verdade e não o que eu quero ouvir, é um alento. Faz com que eu acredite ainda mais em nós dois.
Eu tenho muita fé. Muita mesmo. Sou esperançosa com relação a minha vida, mas não perco mais o foco do que é real. Já perdi. Já vivi acreditando apenas no que eu queria acreditar, já vivi relacionamentos em que não importava o que os outros me dissessem, eu não tinha ouvidos pra ouvir a real. Eu só ouvia os "amigos" que me diziam pra acreditar que tudo ficaria bem, que todos se modificam ou que a vida é bela e no final tudo dá certo. Quem me dera ter ouvido quem me disse que tem gente que não, nunca se modifica. Teria me poupado um bocado de sofrimento. Eu tento ser pros meus amigos o que gostaria que eles fossem pra mim. Tento ser o pé no chão, tento ser o que chama pra terra, a amiga que faz refletir. Sou assim com meus amigos porque não quero só escutar opiniões que batam com as minhas, prefiro saber o que vai no coração deles de fato. Não quero que fiquem com medo de me magoar, de me machucar com suas opiniões verdadeiras. Hoje eu acredito que tudo dá certo, sim, se eu trabalhar pra isso. Se eu fizer escolhas conscientes. Se eu tiver ouvidos pra ouvir e, sabendo a verdade, poder tomar minhas decisões com base em realidade e não apenas em sonhos.