quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Ele me supreende




Taninha trabalha lá em casa há 12 anos. É tanto tempo e vivemos tanta coisa juntas que não sabemos mais onde começa a relação de trabalho e onde termina a relação familiar. Taninha é muito querida e amada por nós. Sempre foi extremamente participativa na criação do Miguel e, depois de mim e do Namorado, é ela quem mais tem entrada com ele. Dá banho, comida, conversa e brinca. Enfim, Miguel cresceu com ela ali em casa e ela sabe tanto de nós e nós dela que não consigo imaginar como vai ser quando Taninha não estiver mais ali.

Pois é. Esse dia vai chegar. Taninha disse que está com saudade da família na Bahia e que vai voltar pra junto dos seus. Vai com marido e filha encontrar o filho que lá já está e outros parentes. Está saudosa de suas raizes. Além disso, o marido perdeu o emprego e as coisas estão mais difíceis por aqui. Nós queremos muito o melhor pra ela. Mas receber a notícia foi como tomar um soco no estômago. 

Fiquei muito mal ontem. Uma mistura de dor da saudade com a nova rotina que terá que se instalar na minha casa, talvez com uma pessoa nova com quem não temos intimidade e que não sabe nada de nós, invadiu meu coração com força. E chorei. Não conseguia dormir. E ficava me perguntando como ela se acostumará a morar em um local tão sem recursos, com escolas  ruins, como dará uma vida melhor pra seus filhos, como ela vai trabalhar por lá? Será que ela está fazendo a coisa certa? Minha mente não parava, invadida por todos esses pensamentos e também de como será minha vida, a vida da minha mãe, sem ela. 

Alguém da família se mudaria pra longe e restaria a saudade e a certeza de que será muito raro estarmos juntos novamente. Uma sensação estranha, quase um desamparo. Uma sensação conhecida pra mim. Vivi exatamente a mesma coisa quando a Cleo que trabalhou na nossa casa por muitos anos resolveu voltar pro Maranhão. Quanto carinho por essa mulher que nunca mais vi. Ainda nos falamos algumas vezes ao telefone, mas o toque, o cheiro, a presença física, nunca mais. E acho que será assim com a Taninha também. Eu já conheço a história e a dor da saudade é só a antecipação do grande afastamento que está por vir. 

Miguel me viu chorando e perguntou o porquê de eu estar tão triste. Eu expliquei. E eu continuava chorando. Minhas lágrimas não paravam de cair. Aí meu filho que parece uma alma antiga e cheia de sabedoria, olhou bem nos meus olhos e falou:

- Mãe, vamos conversar sobre isso, beleza? Escuta o que vou lhe dizer.

Ok. Pensei em meio as lágrimas. Beleza.

- Você sabe, mãe, que chorar não vai adiantar nada, não é? Você toma as suas decisões pra sua vida. A Taninha toma as decisões pra vida dela. Se a Taninha decidiu que precisa parar de trabalhar e voltar pra casa dela na Bahia, ela é que escolhe. Entende, mãe: a escolha da Taninha é a escolha dela. E a sua escolha é sua. Não adianta chorar. 

Cara, eu faço terapia há quase 13 anos e meu filho já nasceu analisado. Do jeitinho infantil dele, cheio de carinhas e gestos, ele me disse exatamente o que é fato: eu não posso mudar as escolhas de ninguém e não devo ficar sofrendo se a escolha do outro não seria a minha. Como disse Miguel em outras palavras: não há nada que eu possa fazer. A escolha do outro não depende de mim. É pessoal e única e exclusivamente de responsabilidade do outro. Sequei minhas lágrimas. 

Hoje pela manhã, a caminho do curso de inglês, agradeci meu filho por ter me consolado no dia anterior, por ter conversado comigo e ter sido tão bacana. E ele me disse:

- Mãe, você chorou ontem, mas a gente é feliz. Hoje é um bom dia pra ser feliz, não é? 

Com vontade de chorar de novo por Deus ter me dado a dádiva de conviver com essa criança tão especial, tão meu amigo, tão cheio de sabedoria, respondi:

- Sim, meu gostosinho. Hoje também é um bom dia pra ser feliz. 

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