Filhos são umas coisinhas lindas mesmo. A gente fica muito apaixonada e acha tudo uma graça. Mas eles também têm o dom de tirar a gente do sério, de enlouquecer qualquer cristão.
Não me acho uma criatura das mais pacientes, mas em relação às pessoas com quem convivo diariamente, como minha mãe e minha irmã, por exemplo, sou quase um budista de tão zen. Minha mãe nunca foi de muita explicação, mandava logo a pancada. Eu nem posso me queixar muito porque, uma vez que não fazia muita merda, também quase não apanhei. Minha irmã adota o mesmo estilo de criação que teve: seu pavio é curto. Curto não, é curtíssimo. Se as meninas bobearem, entram na pancada em grande estilo e não importa onde esteja ou na frente de quem esteja.
Por isso, sou considerada uma perfeita idiota aos olhos delas. Sempre acham que eu tenho paciência demais. Que eu demoro muito pra dar uma ordem, que eu converso demais, que tento mostrar o porquê quando a criança obedeceria mais rapidamente com uma ordem simples e direta. Talvez elas tenham razão em alguns momentos. Mas o fato de eu ter paciência ou tentar o caminho da conversa, não significa que eu nunca "entorne o caldo". Não, nunca bati. Não gosto de violência e acho uma covardia fazer isso com um filho, mas não estou condenando quem o faça. Eu apanhei, poucas vezes, é verdade, e não morri. Mas não adoto essa conduta porque não me faz bem. Mas sei que muitas vezes a gente não dá um tapa por muito pouco, porque filho tira do sério mesmo.
Miguel é uma criança muito saudável. É espantoso como meu filho custa a ficar doentinho. Até gripe não derruba o meu filho. Fica entupidinho, com secreção pelo nariz e tosse, mas não fica arriadinho nem nada. Só que quando está tossindo muito e encatarrado, preciso dar o xarope. E pro Miguel, tomar xarope é um parto. Nem adianta tentar colocar junto com o suco porque o garoto sente o gostinho de longe. Ninguém mais engana essa criança. Negocio a tomada de xarope com ele o tempo todo. Quer suco? Só depois do xarope. Quer ver filme? Só depois do xarope. Quer o Ipad? Só depois do xarope e por aí vai.
Só que nessa semana, na hora do xarope, depois de negociar muito e Miguel dizer que iria, finalmente, tomar o xarope, minha paciência se esgotou. E aí é que está o problema com gente como eu que tem muita paciência: quando o saco enche, a coisa fica feia. E daí que fui dar o xarope pro moleque, ele pegou o copinho, entornou o xarope na boca e ficou com a boca aberta, deixando o xarope escorrer pelos cantos dos lábios, caindo pelo pescoço, pela camisa e pingando no chão. Eu observando a cena, incrédula, vendo meu filho deixando a boca mole só pro xarope sair da boca e ele não ter que tomá-lo. Olha, uma coisa muito doida se apoderou de mim. Senti minha cara queimar e meu sangue ferver de ódio. Minha pele formigava, meu cabelo arrepiou com tanta falta de respeito. Só sei que comecei minha sessão de gritos porque bater não bato, mas grito que é uma beleza. E aí começou a bateria de frases feitas, que todo mundo já ouviu da mãe: "Tá pensando que eu sou palhaça? Eu tenho hora pra ir pro trabalho! Eu estou cuidando de você e é assim que você me agradece?" Arranquei a camiseta que ele estava usando, porque ficou toda melada de xarope, com tanta rapidez que Miguel ficou com cara de desnorteado. Enfim, de tanto gritar, cheguei a ficar rouca e, não satisfeita em ver os olhos arregalados do meu filho olhando pra mim como se desconhecesse essa mãe que encorporou um espírito maluco, falei pra ele:
- Pois agora você vai tomar o xarope de qualquer jeito. Por bem ou por mal! Chega! Não tem mais conversa. Abre a boca!!
Coloquei o xarope no copinho novamente, entornei o dito na boca aberta da criança e a fechei com minhas mãos obrigando-o a engolir o infeliz xarope.
Missão cumprida.
Fiquei tão cansada dessa gritaria toda que parecia que tinha levado uma surra. A impressão que tive foi a de que minhas energias foram todas sugadas. É cansativo esse negócio de perder a paciência. Não gosto de brigar, mas tem vezes que não dá pra fugir de uma briga. E Miguel provocou minha fúria.
Como tudo tem um lado bom nessa vida, Miguel parou de me testar na hora do xarope. Engole o remédio de primeira sem precisar de muita barganha. Assim, posso concluir que em alguns momentos, pra se educar e impor limites, uma atitude mais direta e ditadora cai bem. E de vez em quando, como que para garantir que eu não terei outro ataque de fúria, Miguel ainda solta: "Eu não vou cuspir, tá, mamãe?"
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