sexta-feira, 9 de março de 2012

Aprisionada

Tenho pavor de me sentir presa. Desde que me entendo por gente tenho medo de perder minha liberdade. E quando penso quando foi que comecei a me sentir assim, a ter esse medo, lembro do tempo em que eu tinha uns 6 anos e já estava na escola quando minha irmã entrou. Temos uma diferença de idade pequena, mas me marcou muito o fato de que, pra ela parar de chorar, me tiravam da minha turma frequentemente pra ficar na sala de aula dela, com os amigos dela. E eu ia. Lembro também de uma ocasião em que houve um passeio para fora da escola e eu não pude ir com a minha turminha, tive que ir com a dela pra que ela ficasse bem. Acho que a sensação de estar fazendo algo que eu não queria fazer mas que seria para o bem estar de todos me deixou esse sentimento estranho de estar indo pra onde a correnteza leva, sem levar em consideração o que eu queria de verdade.

Depois disso, ao longo da vida, muitas outras vezes me peguei sendo facilitadora pros outros, fazendo coisas que nem sempre estava a fim, só pra que tudo ficasse bem, pra que não houvesse briga ou discussões e, no fundo, me sentindo presa dentro dessa situação. Logo vinha o pânico, esse sentimento de estar presa, sem fazer o que queria ter feito. 

Vejo que trouxe pra adolescência e vida adulta muitas dessas memórias da infância e dessas sensações. Eu tive muita dificuldade com fidelidade: queria namorar mas não queria perder todas as opções que a vida de solteira propicia. Sempre achava que podia estar perdendo algo melhor. No fundo, estava sempre insatisfeita, buscando alguma coisa que nem sabia o que era. Só a maturidade pra me fazer entender que ser fiel é uma escolha natural quando se é feliz. 

Por ter tanto medo de ser aprisionada é que demorei tanto a decidir ter filhos. Por ser inteligente, sabia que minha vida sofreria muitas modificações - mesmo que não imaginasse o tanto, nem em minha previsão mais pessimista. Também por ser inteligente, não me iludia: sabia que não teria mais a liberdade da qual vinha usufruindo até então. 

Quando engravidei, foi uma festa muito grande! Eu e Hugo ficamos felicíssimos, afinal estávamos querendo muito. Só que passado esse primeiro momento de alegria gigante, fiquei muito deprê. Tem gente que tem depressão pós parto. Eu tive depressão pré parto. Os três primeiros meses da gestação do Miguel foram bem difíceis pra mim porque foi aí que a ficha caiu de que era irreversível, não tinha mais volta: eu teria um filho e minha vida  nunca mais seria a mesma. E a sensação antiga do medo de estar presa voltou com tudo. Meus medos juntos com meus hormônios loucos me faziam chorar alucinadamente por tudo e por nada e eu tinha pânico do que iria acontecer comigo. Como eu lidaria com tudo. Passados os meses iniciais, minha depressão passou e o medo diminuiu.

Hoje, depois de 2 anos e 10 meses do nascimento do Miguel, já me acostumei com sua presença e com todas as modificações que minha vida sofreu. Amo esse serzinho fofo e engraçado mais que tudo! Mas preciso confessar que ainda tenho um medinho - ou seria um medão? - de vez em quando. E ele volta nas situações mais inusitadas. Agora mesmo, quando ele saiu da creche pra ir pra escola e tive que fazer a adaptação com ele, por exemplo. Olhando pra essa situação depois de algumas semanas, vejo que estava  preocupada com meu filho, sim, com medo de ele estar sofrendo com a mudança e tudo o mais, mas também tinha o meu medo. Medo de ter que ficar com ele ali na escola por muitos dias enquanto eu tenho tanto pra fazer no trabalho... Medo de ficar presa na escola com ele e ter a outra parte da minha vida parada enquanto Miguel não se adaptava a nova rotina. Meu desespero era um pouco por ele, mas era muito por mim também. Reconhecer isso me assusta. Eu ainda tenho medo de tudo o que não posso controlar, ainda me desespero diante de certas situações onde me vejo sem escolha. E embora eu sinta que, por meu filho ser prioridade pra mim, não pensaria duas vezes antes de ficar com ele na escola quantos dias fossem necessários até ele se adaptar, sinto que não conseguiria fazer isso sem pensar nas coisas que estaria deixando de fazer, que teria que me desdobrar em mil Paulas para cumprir prazos. 

Bom, o fato é que Miguel não precisou que eu ficasse com ele na adaptação mais que três dias. Mas também é fato: e se ele precisasse de muitos dias? Tenho vergonha de admitir que, se ele precisasse ficar semanas comigo na escola, eu ficaria com ele, mas, no fundo, eu não queria fazer isso. Fico me sentindo estranha por pensar assim, mas eu preferia estar realizando minhas próprias tarefas e projetos a estar na sala de aula do meu filho observando as atividades dele por dias e dias. Por isso tudo que sinto, não deixo de me questionar como mãe. E não ser igual às outras mulheres que dizem que a maternidade basta pra elas, me deixa um pouco mal. Eu não sou assim e, no fundo, nem quero. Só sei é que preciso tentar resolver esse medo que existe em mim, ainda, de sentir-me aprisionada. Preciso trabalhar isso dentro de mim pra não ficar me sentindo péssima por ser como sou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário