terça-feira, 10 de junho de 2014

Careta

Não sei se é radicalismo da minha parte, mas parece que no mundo de hoje está tudo virando ao contrário. Quem não paga suas dívidas, tem sempre uma anistia ou facilidade para pagá-la depois, como no caso das multas de trânsito ou cartão de crédito. Sinto-me sempre uma idiota por pagar minhas multas em dia e depois ver que quem deve um horror em infrações de trânsito tem 50% de desconto para quitar. O certo parece que está virando o errado. Normal agora é não se chocar mais com impunidade ou falta de caráter. E isso está ficando tão recorrente que chega a me assustar.

Essa semana eu estava folheando uma das revistas mais vazias do século: Caras. A revista é tão idiota que quando você vira a última página, não sobra nada, a bichinha está datada, velha que só. Em uma semana, fulaninho e fulaninha estão comemorando o encontro de suas almas gêmeas, três semanas depois são capa da revista novamente, só que contando  como estão "encarando o mundo depois da separação". Enfim, é tudo descartável. Aí nessa Caras que eu estava lendo, olhando as fotos dos vestidos lindos das celebridades ou me inteirando do mundo das fofocas (e mudando a minha vida com tudo isso!! hahahahhaa), tinha uma entrevista com a Ana Paula Tabalipa, uma atriz que tem 3 filhos e está grávida do quarto. O primeiro filho é do primeiro casamento, os outros dois são do segundo relacionamento e essa gravidez é de outro rapaz. Na entrevista ela é questionada a respeito de como é o relacionamento de seus filhos com seus pais. Pra minha estranheza, ela respondeu que "costuma brincar que os filhos são só dela e pronto." Não entendi muito bem o que ela quis dizer com isso... Quer dizer que ela é uma mulher independente e não precisa do apoio dos progenitores? Quer dizer que os filhos não sentem falta da presença paterna? Quer dizer que não importa de quem sejam filhos, ela é a mãe e isso basta? Bom, cansei de entender e joguei fora essa frase meio sem nexo pra mim e segui lendo a matéria.

A repórter, em seguida, perguntou a respeito de seus relacionamentos não serem duradouros e tal, se isso trazia algum problema pras crianças. E ela respondeu o seguinte:

"Há uns 2 anos, Tom contou que nenhum amigo da escola tinha pais separados. Aí, eu disse: nossa, que gente careta! Vou te tirar de lá! Mas agora já tem gente separada. E não estou nem aí para o que falam. A vida é minha, ninguém paga minhas contas. Somos felizes, é o que importa."

Confesso que fiquei ainda alguns segundos, entre confusa e perplexa, olhando pra essa resposta. Peraí...

Quer dizer que agora também vou ser chamada de "careta" por ser casada? Normal agora vai ser casar e separar? Desculpem, mas eu casei pensando em ser pra sempre. Aceito perfeitamente que há relacionamentos que não dão certo e acho, exatamente como ela, que o que importa é sermos felizes. Mas não vou nunca concordar que casar e separar é ser cool e que viver a vida toda com a mesma pessoa é ser careta. Caretice não tem nada a ver com estado civil. Se ela quis dizer que nos dias de hoje é muito difícil não ter entre as crianças da mesma classe pelo menos uma com pais separados, concordarei. É verdade. Os tempos são outros e ninguém é obrigado a ficar casado, numa infelicidade tamanha, se o relacionamento azedou. Mas, pode ser uma visão romântica da minha parte, acho muito bacana que a maior parte dos amigos do filho dela tenham seus pais vivendo juntos, em harmonia, porque criança precisa de pai e mãe perto. E precisa muito mais de pai e mãe felizes, eu sei. Mas é inegável que  quando se tem pai e mãe perto e vivendo felizes, é maravilhoso. Chamar um casamento de caretice e ainda brincar dizendo que vai tirar o filho de uma escola com gente careta, ou seja, casados, é um pouco extremo. 

Mais adiante, na entrevista, ela seguiu justificando o porquê de seus relacionamentos não irem adiante:

" Acho lindo quem fica junto até velhinho, mas nunca imaginei isso pra mim porque sou muito prática. Não está dando certo, separa! As vezes sou até prática demais, de repente podia ter conversado, tentado mais uma vez... Mas, não. O que importa é a felicidade. Não fico sofrendo."

Pois é. O que ela chama de praticidade, eu chamo de preguiça. Desculpe, mas não pense que nossos avós e pais que viveram ou vivem juntos até hoje não passaram por maus bocados, altos e baixos. Não estou aqui falando de relacionamentos infelizes, onde uma pessoa está subjugada à outra, ou onde há uma relação de dependência seja econômica, financeira ou psicológica. Estou falando de relacionamentos saudáveis. Nenhum relacionamento dura 2, 3 ou mais décadas, se não houver muito bate-papo, muita vontade de estar junto com aquela pessoa escolhida, por quem seu coração bateu mais forte ou descompassado um dia. Nenhum casamento dura se não houver paciência e tolerância com o outro. Compreensão nas horas difíceis, amizade. Nenhum casamento resiste se você não respirar fundo e pensar duas vezes. Se você não quiser fazer dar certo. Realmente, se você, na primeira briga ou divergência de opiniões, for "prática" e colocar sua bolsa no ombro e der tchau, não vai durar mesmo. Nenhum relacionamento dura com tanta "praticidade". E o pior é que, agindo de forma tão prática, corre-se o risco de viver em busca do que acha bonito - "ficar junto até velhinho" - sem nunca encontrar. Porque pra ficar junto até ficar velhinho é preciso, em primeiro lugar, de amor. E é necessário, também, esquecer a preguiça e ser corajosa pra defender esse amor de tudo o que acontece todos os dias na nossa vida cotidiana pra sabotar esse amor. É muito mais fácil não lutar. É muito mais "prático".  É muito mais fácil simplesmente acreditar que o novo é melhor pra você. Que o namorado ou marido novo serão melhores pra sua vida. O novo não tem defeito, já reparou? Até deixar de ser novo e passar a ser velho. 

Portanto, não venham agora inverter mais isso e querer que o bacana, o descolado seja ter pais separados. Ter pais separados é, simplesmente e sem traumas, ok. Nem ruim, nem bom. É ok. Se os pais estão felizes, se relacionam bem ou, pelo menos, cordialmente em prol dos filhos, mas vale a separação que ter os pais vivendo sob o mesmo teto às turras. Mas eu não vou ser chamada de careta por acreditar no amor e nos relacionamentos duradouros. Acredito no amor e, pra mim, amor nunca foi descartável. Nem nunca será. 



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