sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Gratidão

Existem situações, toques, sorrisos e palavras na vida que tem o poder de fazer tudo valer a pena, têm o poder de dar sentido à nossa existência, de trazer de volta o vigor e força em um dia tumultuado ou cansativo. Não é segredo pra ninguém que amo meu trabalho, minhas funções. Gosto de lidar com gente, por mais difícil que seja às vezes, amo estar cercada por gente, de conversar, de rir, de aprender com experiências alheias. Normalmente, me concentro tanto em aprender com quem está ao meu lado, que esqueço que posso ensinar. Sim, a vida é troca. 

Sempre falo pras pessoas que trabalham comigo diretamente que ninguém cruza nossa estrada à toa. Ninguém está na nossa equipe sem uma razão. Pessoas colocadas juntas para dividirem seus dias têm o que aprender e ensinar umas com as outras. Sempre falo que precisamos estar atentos para toda e qualquer oportunidade de aprendizado e oportunidade para oferecer a mão a quem estiver precisando. Eu me concentro em ser facilitadora para que todos tenham uma ótima experiência de trabalho desde o primeiro momento, desde o início da convivência. Muitas vezes essa convivência não é fácil, há discussões, divergências. Mas meu foco é aprendizado e compreensão. Sem ser leniente ou idiota. Meu foco é na justiça pois não quero dar nada que não seja merecido e nem tomar pra mim algo que não me pertença. Confio até me provarem o contrário. Acredito no potencial das pessoas pra mudarem e crescerem. Esse é meu jeito de gerir meu grupo. 

Penso que se eu puder ajudar aqueles que estão ao meu lado, pertinho de mim, tornando suas vidas menos pesadas, levando um pouco de alegria, ajudando-os a passar por suas situações chatas da melhor maneira possível, estarei cumprindo um dos meus papéis nessa vida. Fico emocionada por ver como acabo influenciando pessoas, como acabo empurrando suas vidas pra frente, mostrando que sempre podemos mais, é só acreditarmos em nós mesmos. E essa semana tive prova, em duas ocasiões, de que estou no caminho certo. E isso me enche de alegria. 

A primeira mensagem que recebi é de uma amiga. Hoje só amiga, mas trabalhamos juntas por anos. Aliás, o improvável aconteceu conosco: conhecemo-nos no trabalho e mesmo depois de tantas mudanças na vida, mesmo depois de não sermos mais colegas de trabalho e depois de não concordarmos em quase nada nessa vida, continuamos nos gostando muito e, acima de tudo, continuamos amigas. E ela escreveu assim:

"Essa mensagem não é pra vaca amiga. É para vaca eterna diretora...

Hoje fui substituir uma professora de Yoga em uma escola judaica lá na zona sul. Alunos do 7º ao 9º ano do ensino fundamental. Galerinha entre 13 e 15 anos...

Mulher... A primeira turma tinham uns 40 alunos. Daqueles adolescentes super, ultra, mega agitados. Do tipo que se estapeavam entre si, berravam, riam, em nada prestavam atenção. Desafiadores, debochados, cínicos e desconfiados.

Eu poderia ter me retraído, pois afinal nunca dei aula para adolescentes (de Yoga). Mas não me abalei. E sabe por quê? Pela experiência que o CCAA me deu. Parece piegas e ridículo, mas não é.

O coordenador da escola resolveu ficar para assistir a aula. E também nem isso me abalou. Já fui assistida tantas vezes dando aula em outro idioma que não era o meu... Fichinha!

Saldo final: O tempo que trabalhei com você me deu essa manha de saber lidar com adolescentes. De saber falar a linguagem deles. De dar a eles o que eles querem sem, no entanto, deixar de oferecer o que preciso. Conquistei os alunos, eles queriam que eu assumisse a turma definitivamente, o coordenador me elogiou, e tudo deu certo. No final só tenho a agradecer a você que nunca desistiu de mim, que sempre me apoiou e incentivou, que sempre achou que eu era uma boa professora apesar de eu viver dizendo que não gostava de lecionar. O aprendizado que recebi trabalhando com você eu carrego para a vida! Queria compartilhar!!"

O que vale mais que isso na vida? O que pode fazer com que me sinta mais plena, mais satisfeita, mais feliz? Reconhecimento. Isso não tem preço. 

A segunda mensagem veio de uma professora com quem convivo há pouco tempo (acompanhada de chocolate!) e, de fato, sei muito pouco sobre ela. Aí vai:

"Beesha! Quer fazer o favor de parar de me confundir? Quando eu acho que a humanidade está perdida, você, sem querer, me põe no prumo de novo!

Essa semana dei aula de literatura, por necessidade, lógico, mas você mostra que confia em mim e isso não tem preço!

Sabe, Paula, a vida pra mim é muito dura, sou eu e Deus, e carinho e confiança, como venho recebendo aqui, são novidades preciosas. Ainda não assimilei isso tudo. Ainda não caiu a ficha de que até para aula de literatura fui convidada a substituir. Sei que ainda tenho muito a aprender, mas sua aposta em mim já é tudo. 

Nem sei mais o que dizer... Milhões de vezes obrigada! Por me fazer acreditar de novo!

PS. - Só os que me fazem realmente felizes, como minha filha, merecem lingua de gato."

Não estranhem a forma de tratamento que as pessoas aqui citadas usam em seus textos (vaca e beesha). Não sei o que acontece mas creio que sou uma pessoa que no minuto seguinte a apresentação está sendo chamada não por PAULA mas por PAULINHA. E é daí pra pior - ou seria melhor? - não sei. Sei que tenho um relacionamento muito próximo com quem trabalha comigo e gosto que tenham essa intimidade pra falar o que pensam e o que sentem, sem melindres, sem segundas intenções. 

À todos que trabalham comigo e que, de um jeito ou de outro, tem sempre um bombom, uma lembrança, um bilhetinho, um beijo: meu MUITO obrigada. Quero dizer - não só pra Cacau (minha amiga de tantos anos!) e Monica (minha amiga de 2 meses) - que sou grata a vocês que fazem parte desse círculo diário de troca de experiências que vivemos no CCAA. Quero dizer que o que aprendemos uns com os outros é o que me move. Não é dinheiro, não é status dentro da empresa, não é posição social. O que me move é reconhecimento verdadeiro. Obrigada por inundarem minha vida com tantos sentimentos lindos... 


quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Falta de Educação

Eu custei muito a levar em consideração a ideia de ter filhos. Quem olha de longe pode pensar que foi por egoísmo ou preguiça. É claro que eu tinha uma certa insegurança com relação a organização da minha vida, quanto a perda da liberdade, tinha muito medo de ficar tolida e, de certa forma, isso acontece mesmo. Quem diz que filho não tira a liberdade de escolher, de ir e de vir, está mentindo. Só que como ter filho é uma escolha, me preparei pra lembrar disso: que Miguel veio ao mundo por escolha minha e que eu SABIA que minha vida não seria mais a mesma. Isso é fato. Tudo bem que não estava preparada pra todas as mudanças e nem pra intensidade delas, mas acho que, pra isso, nunca ninguém está. A verdade é que sempre tive muito medo de todas as transformações que ter um filho opera na vida da gente mas, principalmente, tinha medo de não conseguir ser pra meu filho o que meus pais foram pra mim.

Quando digo isso, refiro-me a saber educar, a ajudar meu filho a ser um homem que saiba que o direito dele acaba quando começa o do próximo. Exatamente por lidar com educação é que tinha tanto medo. Ao longo dos anos, venho presenciando pais que têm seus filhos mas não querem ter trabalho pra educá-los. Vejo famílias permissivas que deixam na mão de seus filhos escolhas que deveriam ser feitas por eles, já que uma criança ou adolescente, muitas vezes, não têm a menor condição de decidir o que é bom ou ruim pra seu futuro. Vejo pais que colocam sempre a culpa nos professores, nos colegas de classe do filho, no mundo. Hoje, responsáveis delegam a tarefa de educar a terceiros: creche, escola, curso de idiomas, vizinhos, babás. Nunca nada de ruim é feito por seus filhos, eles nunca tem culpa de nada, porque é mais fácil passar a mão na cabeça agora e minimizar os problemas que lidar com a situação e traçar um plano que venha corrigir e educar. Essa situação é atordoante, acreditem, quando você lida com isso diariamente. 

Há pouco tempo, fui à festinha de 5 anos do meu afilhado. Logicamente, a maior parte das crianças também tinha 5 anos, assim como o Miguel. E o que vi na festinha foi apavorante. Eu não tenho mais tolerância pra criança mal educada e muito menos pra pais dessas pobres crianças, porque passo meus dias na função de levar valores de respeito pras crianças dentro da minha escola e dentro da minha casa. É uma preocupação constante, que não me deixa nunca. Por isso, torna-se difícil ver um menino de 5 anos furando uma fila e ouvir seu pai falar ao ver o que o filho fez:

- Olha lá! Fulaninho já furou fila de novo! Esse menino! hahahaha

O pai virou as costas e continuou sua conversa como se nada tivesse ocorrido, como se furar fila fosse normal. Pelo tom, dá até pra pensar que ele acha engraçadinho seu filho mostrar o quanto é "safo" ou "esperto". E o filho, que vê no pai alguém conivente com sua atitude, começa a entender que pode tudo e, pior, começa a entender que, talvez, seu pai não se importe tanto assim com ele porque está deixando passar uma oportunidade para educá-lo com carinho. Naquele momento, a leitura feita pela criança pode ser apenas a de que o papo que o pai está levando com o amigo é mais importante que dar atenção ao filho fazedor de besteiras.

Meu filho não é um primor de educação, mas estou batalhando firmemente para que seja. Não admito falta de respeito, não obedecer, não honrar a casa de seus amigos. Miguel precisa respeitar o espaço dos outros, nem que pra isso seja tido como um idiota. É preciso ter convicções de valores muito fortes para não sucumbir e acabar achando "que o mundo é dos espertos" ou dos que preferem adotar a postura de que não sabem de nada e, por isso, nunca tem culpa, nunca assumem responsabilidades, nem arcam com as consequencias de seus atos. Vivemos em um pais sem moral, onde nossos governantes não passam nenhum exemplo positivo. E isso se alastra por toda a sociedade e se infiltra, infelizmente, no seio da família. Justo na família, que aprendi ser - e vejo que é mesmo - o núcleo social mais importante para a formação de um ser humano.

Ainda na mesma festa, onde as crianças brincavam com os créditos que recebiam em um cartão, várias vezes crianças acompanhadas de seus pais, ficavam brincando repetidamente, quantas vezes quisessem, enquanto uma fila de espera se formava ao lado do brinquedo. O jogo acabava e o pai passava o cartão novamente, sem se preocupar se havia outras crianças querendo usufruir da diversão. Hugo precisou, depois de ver o terceiro "game over" aparecer na tela do brinquedo, declarar:

- A vez do seu filho já terminou, ele deve entrar no fim da fila pra brincar novamente. 
O pai ainda argumentou:
- Não, ele ainda não acabou. Só mais um pouquinho.
E o Hugo repetiu:
- Ele precisa entrar na fila novamente. Na tela está escrito "game over" e isso quer dizer que a vez dele já passou. Saia do brinquedo, por favor. 

Precisava disso? Sempre é necessário que se lute por coisas tão básicas, quanto respeitar a vez dos outros? Parece que sim. No mesmo brinquedo, enquanto Miguel jogava, um outro menino chegou perto e perguntou pro Hugo:

- Você pode passar o cartão pra mim, tio?
Hugo respondeu:
- Assim que Miguel acabar eu passo o cartão pra você. Onde está seu cartão?
O menino de 5 anos respondeu:
- O meu cartão, não, tio. Ele já acabou. Quero que você passe o cartão do seu filho pra eu brincar. 

Oi??

Pois é. Isso mesmo. Hugo, que não tem papas na lingua, falou logo que ele pedisse mais créditos pro pai dele porque se ele brincou com todos os créditos dele, o Miguel também o faria. Agora, pensem bem, um menino pequeno que já é adepto do "só tem esperto no mundo porque tem otário". Só que falou com os "otários" errados. 

Na hora do parabéns, foi uma tristeza. Antes mesmo de cantarmos parabéns, os meninos já estavam atacando a mesa, pegando os doces. Os pais estavam todos ali, observando os filhos estragarem a decoração da mesa antes mesmo do aniversariante ter seu momento especial. Ninguém, nem um pai, nem umzinho, falou NADA. Foi como se nada estivesse acontecendo. Todos entretidos com suas conversas, com seu copo de cerveja. Miguel olhava pra mesa e olhava pra mim. Titubeando na hora de decidir o que fazer, resolveu chegar perto e me perguntar:

- Mãe, posso pegar brigadeiro?
Eu respondi que não, que só se pode pegar os doces da mesa do bolo depois de cantar parabéns para o aniversariante. Miguel questionou:
- Mas os meninos já estão pegando os doces, mãe. Não vai sobrar nenhum pra mim. 
Eu expliquei:
- Filho, eles estão errados. Isso não é educado. Ainda vai ter brigadeiro depois do parabéns. Se não tiver mais, eu prefiro comprar brigadeiro pra você comer, mas não quero que você faça como esses meninos. Você gostaria que sua mesa do bolo ficasse toda desmontada antes da hora do seu parabéns?
Miguel se calou, pensativo, e assim que acabou o parabéns, me perguntou:
- Agora posso pegar os doces?, e lá foi ele pegar quantos doces quis, na hora certa. 

Enfim, saí da festa com uma mistura de sentimentos. Sentia uma falta de esperança no futuro do país, sabe? Vendo tantas crianças que crescerão sem um pingo de limite, achando que tudo o que quiserem é possível, é aceito, crianças que se tornarão adultos inconsequentes. Enquanto as pessoas delegarem a responsabilidade da educação dos seus a outros, só deixarão no mundo egoístas, pessoas que só pensam em si, que não enxergam nada além do próprio umbigo. Senti uma tristeza por parecer uma tola num mundo de espertinhos. Depois, me arrependi de ter sentido essa tristeza, pois isso só expõe minha própria fraqueza. Não devo ter autopiedade por agir certo. Isso significa que preciso ser ainda mais firme em minhas convicções, que tenho que ser mais forte e sentir-me grata pelos valores recebidos em casa e por ter consciência do quanto preciso perseverar nessa tarefa árdua de educar meu filho, custe o que custar. Se o preço a pagar é parecer idiota, que assim seja. Mas não vou me contaminar e nem deixar-me levar por essa onda de falta de respeito e educação generalizadas. Eu sabia que ter filho me daria trabalho e sabia também que teria trabalho triplicado pra fazer dele um cidadão de bem. Estou me jogando nessa tarefa. Estou plantando pra que meu filho possa colher os frutos. E para que ele, amanhã, possa plantar o bem, assim como meus pais fizeram por mim.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Guardiões das Galáxias



Vou lhe dizer, depois de tanto tempo indo ao cinema pra ver filmes infantis, toda vez que levo Miguel tenho a impressão que vou ver mais do mesmo. Minha sorte é que gosto, sempre gostei. Assistia a filmes infantis muito antes de ter filho. Mas depois de 5 anos assistindo a todos os lançamentos, sem escolher nada, vendo apenas tudo o que está em cartaz, a coisa fica cansativa mesmo. Por isso, fiquei muito surpresa quando, no sábado, me peguei dando muitas gargalhadas no cinema assistindo a Guardião das Galáxias. 

O filme é empolgante a começar pela trilha sonora! Durante o filme inteiro só se ouve clássicos do rock anos 70. Além de ação, o filme tem um humor ácido, surpreendente. Um enredo com romance e que dá valor a amizade. Eu realmente me diverti. Foi um ótimo programa pro meu final de semana. Fora que Miguel ama música. Nunca vi nenhuma criança da idade dele ser tão ligado em música. Ele amou a trilha sonora e além de ficar cantando a música "Hooked on a feeling" o resto do dia, pediu ao Namorado pra comprar pra ele poder escutar quando quisesse. Enfim, foi um programa de criança delicioso! A Marvel mandou muito bem!

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Eu quero escorpião!



Tem gente que fala de um jeito que só quem é da família entende. A convivência faz as pessoas se entenderem até por um olhar e quem está de fora acha impossível decodificar uma espécie de "dialeto" compreensível apenas para quem está acostumado. Eu tenho uma amiga desde criança, a Jô, que tem um pai muito fofo, só que quando eu ia na casa dela e ele falava comigo querendo ir além do "oi, como vai", sempre muito simpático, eu ficava balançando a cabeça como se compreendesse tudo mas não estava entendendo patavina! Eu perguntava a ela: "Jô, você entende o que seu pai fala??" E a Jô, lógico, não só entendia, como servia de tecla SAP pra mim. 

Quem nunca passou por isso com nenhum adulto mas tem criança em casa, com certeza, ou já viveu essa situação ou vai viver. A criança ouve a gente falando uma palavra mas não reproduz do mesmo modo, parece que no conversor de entendimento da cabecinha deles, acontece alguma coisa muito esquisita e a reprodução nunca é o que quer dizer.

Quando a Duda tinha uns 4 anos, ficou em desespero dentro de casa pedindo pra assistir "Amanquezev". Gente, minha mãe com o controle remoto mudando compulsivamente todos os canais pra tentar achar que diacho de programa era o tal do "amanquezev" do qual a garota falava. Duda repetia alto como se tivéssemos problemas de audição e depois gritava mesmo. "Eu quero ver amanquezev!!! AMANQUEZEV!!" Quem conhece minha mãe sabe que não é dada a muita paciência e já estava aos berros com a garota quando minha irmã, finalmente, adentra a casa.

- Gente, o que está acontecendo? Por que essa gritaria?

Minha mãe explicou o que estava acontecendo e minha irmã aproximou-se da filha e perguntou:

- Filha, o que você está querendo, fala pra mamãe...
E Duda respondeu:
- Eu quero ver "Amanquezev", mãe.
Aí, minha irmã, como se estivesse ouvindo a coisa mais natural do mundo, como se tivesse um dicionário para loucuras infantis, disse:
- Sim, ela quer assistir o filme "A Branca de Neve".
Fim do mistério, todo mundo embasbacado por tanto tempo perdido. Só mãe mesmo pra entender o filho.

Pobre Dona Iris, achou que nunca mais fosse passar por isso. Coitadinha. Enganou-se terrivelmente. Afinal, chegou o Miguel e começamos tudo de novo. 

Semana passada, mal abri a porta da sala chegando do trabalho na hora do almoço pra levar o Miguel pra escola e já escuto os berros do Miguel com a avó:

- Você não entende nada que eu falo! Eu quero escorpião! 

Achei melhor ir ao banheiro antes de me dirigir a cozinha, afinal de contas, precisava fazer xixi antes de entender o motivo do furdunço. Do banheiro, continuei escutando os dois alterados. Minha mãe dizia ao Miguel:

- Miguel, já coloquei comida no seu prato e você não come! O que você quer? Vai chegar atrasado na escola!
- Vó, eu quero escorpião!! Você não está escutando direito? (Abusado meu filho, né?) E S C O R P I Ã O!!!

Cheguei na cozinha e minha mãe já estava com as bochechas vermelhas de raiva. A coisa estava prestes a pegar fogo. 

- O que está acontecendo?, perguntei.
- Minha filha, o Miguel hoje acordou do avesso! Já coloquei o estrogonofe no prato, já coloquei arroz e batata e ele continua gritando que quer comer escorpião. Eu desisto!

Cheguei perto do Miguel e perguntei:
- Filho, o que você quer comer?
E ele respondeu:
- Mãe, minha vó não botou escorpião no meu prato e eu quero comer escorpião!

Virei pra minha mãe, já caindo na gargalhada, e traduzi:

- Mãe, ele quer champignon... Você não colocou champignon no prato dele. Hahahaa Champignon!

Peguei o prato, fui até a panela e enchi de cogumelo o estrogonofe do meu filho e pronto. Acabou a confusão. 

Sou mais uma mãe tradutora. E qual a mãe que não é?





quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O presente da Fatinha

Essa semana, quando ganhei um presente do nada, assim, sem esperar, sem motivo, sem data especial, da Fatinha, fiquei pensando em quanta coisa já vivi nessa casa. Em como me sinto amada e como amo essas pessoas que trabalham comigo. Fiquei pensando em todos eles e como a gente convive tanto no trabalho e que é impossível, pelo menos pra mim, não me envolver. Venho tentando há muitos anos separar o pessoal do profissional e estou muito melhor que já fui, mas a verdade é que essas 30 e poucas pessoas que vejo quase todos os dias são família pra mim. 

Eu não sou o tipo de pessoa que não se envolve. Eu totalmente me envolvo, me dou e me entrego pra tudo o que resolvo fazer. Não tenho meio termo quando se trata de trabalho, sabe? Se vou fazer, que seja bem feito. Se vou tentar, que seja pra ter certeza que dei 100% de mim. E aí, com aquela sacolinha do presente da Fatinha na mão, fiquei pensando em como é bom a gente se relacionar e acabar se mostrando, com todos os defeitos e qualidades, pra pessoas que estejam dispostas a ajudar umas às outras e a crescerem. Nem todo mundo entende as mil nuances que cada personalidade apresenta. Nem sempre é fácil a convivência em família. E no trabalho não é diferente. A única coisa da qual não se pode abrir mão no trabalho é da entrega e de saber que todos os lugares possuem regras e que precisamos nos adaptar a elas se quisermos durar. Não posso dizer que conheço a todos até do avesso. Nem a gente se conhece totalmente, né? Mas posso dizer que os conheço e que conheço alguns de seus defeitos e muitas das suas qualidades. Eles também me conhecem. E também conhecem os meus defeitos e as minhas qualidades. 

Tenho no CCAA uma família. Aqui no CCAA Ilha conquistei meu espaço, abri meu caminho, ganhei respeito e confiança de meus colegas, de pais e de alunos. Aqui, passo mais tempo que em minha casa. Com essas pessoas, abro meu coração, sim. Muitas vezes choro, muitas vezes morro de rir. Eles me ensinam e me fazem ir em frente. Há uma troca muito positiva e há muitas exigências também. Eles me cobram decisões, postura, às vezes com um olhar apenas. E eu cobro comprometimento, doação, vitória. Como uma família, temos momentos bons e ruins. E no filminho que passou em minha cabeça enquanto olhava pro meu presente inesperado - o presente da Fatinha - vi cada uma das pessoas que estão ao meu lado. E todas as suas histórias. 

Dolores com seu jeito carinhoso e doce.

Andrea Santiago com sua fala mansa e tranquilidade. 

Ramon Ted... Meu amigo, meu irmão. Meu companheiro desde 1997. Sempre juntos. Sempre parceiros. 

Maura  com seus cabelos lindos e olhos brilhantes, com sede de fazer tudo certo.

Jacqueline e todas as nossas muitas noites dançando quando éramos apenas meninas que podiam se dar ao luxo de virar muitas noites dançando e rindo e vir trabalhar no dia seguinte como se nada tivesse acontecido.

Leandro do Vale menino. Trazido pelo pai. Um pai lutador que pagava o curso de inglês do filho pra que ele se tornasse um homem de bem. Um homem como ele é hoje. O pai não está mais aqui ao lado dele. Eu estou. 

Pensei em Flavio Fontes e ouvi suas risadas. Senti sua alegria e vivi novamente tantos altos e baixos que passamos. Sempre estive com ele, torcendo, mesmo à distância quando tivemos que nos separar, pra tê-lo perto de mim de novo. 

Leo Farah e todas as broncas que já dei. Tudo pra ele crescer e amadurecer. Eu acredito no potencial dele e, desconfio, acredito, muitas vezes, mais que ele mesmo. 

Norma com quem sempre sonhei trabalhar e hoje vejo esse sonho tornar-se realidade.

Bruno Torres, o mais ogro dos ogros. O mais divertido. O cara mais cheio de proteção que já conheci na vida. Um moloide por dentro. Eu sei disso. 

Larissa e todas as vezes que me pediu desculpas. E me vi dizendo a ela que não aguentava mais vê-la me pedindo desculpas. E, naquele momento, sei que ela entendeu o que eu quis dizer. 

Joubert e nossos tantos anos de amizade e companheirismo. 

Cinthia. Meu amor. Minha linda que é mais linda por dentro que por fora. Por mais incrível que isso possa parecer. 

Jonas e sua alegria. Que maravilha é ter você por perto. Que astral do bem. 

Sabatino. Meu rabugento favorito. O cara mais comprometido com tudo o que é certo. O cara mais incrível e desbocado. Vi sua moto e seu casaco de couro. 

Carol e sua juventude. Seu jeito, por vezes, afoito. Inteligente. Perspicaz. Criança querendo o mundo e que sabe que pode conseguir.

Barbara e sua quietude e benevolência. Alguém que muito observa. Alguém com quem sempre pude contar. 

Jefferson firme, forte. Um cara cheio de amor e de vida. 

Priscila é aquela que se mostra as poucos, sente o terreno. Sua timidez a proteje e também cria um escudo que já foi derrubado. Vejo como está mais solta, mais risonha, a cada dia. 

Ana Enes... A mais fofas das fofas. Quem estiver em seu coração, tem tudo. 

Graça Mattos e sua letrinha gigantesca. Suas milhões de explicações, sua risada de porco. Seu coração enorme. Sua organização. 

Vanessa é o retrato de alguém que sabe voltar atrás e começar de novo. Ganhou minha admiração no dia em que me convenceu de que precisava de uma chance. E ela estava MUITO certa. 

Andreia Ferreira é a luta em pessoa, uma guerreira.

Ana Maria Sales é a doida de coração maior do mundo. De uma alegria inesgotável. De uma loucura deliciosa.

Monica bateu na minha porta e sua presença é um presente.

Dani Cavalcante, lembra quando lhe dei aquela bronquinha de leve na minha sala quando você ainda era ajudante? Sua cara é linda até quando leva bronca!! 

Eldir é minha prova de fé e paciência.

Katia é a reclamona gente boa. Desenrolada. Parece minha mãe porque reclama muito de fazer as coisas, mas sempre as faz e agrada a todos. 

Stephanie, Coração e Mayara ... Que privilégio é ensinar tanto a quem é tão novo e tão cheio de vida. 

Valdir é meu protetor. 

Jairo é um anjo, uma dádiva, um conforto.

Andrea, Fatinha, Fernanda e Edmar são os pobres que me suportam. Com eles eu conto como nunca contei com ninguém. Somos tão bons juntos que às vezes acho que somos um só. 

De todos esses eu poderia falar milhões de defeitos. Todos eles têm defeitos. Assim como eu. Mas somos uma família e muitas vezes nos detestamos pra nos amar em seguida. E assim vamos indo, caminhando, aprendendo, ensinando. Não somos perfeitos. Bacana pensar que um gesto de carinho da Fatinha me fez refletir sobre todos esses anos que estou aqui nessa casa. E no tanto que vivi e que venho crescendo. Sei que muitas vezes eles não recebem o melhor de mim. Mas eles podem ter a certeza de que me têm por inteiro. Família é isso. 

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Transformers



Miguel estava pedindo que eu o levasse ao cinema pra ver Transformers desde que o filme foi lançado. E eu estava evitando porque vi que o filme tem quase 3 horas de duração e imaginei que meu filho não fosse aguentar ficar tanto tempo dentro do cinema ou que fosse dormir. Sim, porque nas últimas duas vezes em que fomos ao cinema, não sei se foi coincidência, ele poderia estar mais cansadinho mesmo, Miguel dormiu da metade dos filmes até o final. Os filmes eram adequados pra idade dele: "Como treinar seu dragão 2" e "Aviões 2"  e eu os achei bem legais. Aliás, eu gosto muito desses filmes infantis, para minha sorte. 

Bom, também não sei se eu é que estava inventando algumas desculpas pra não levá-lo pra assistir Transformers porque não gosto muito desse tipo de filme e não assisti a nenhum outro filme dessa série. Mas, era dia dos pais e o Hugo também queria assistir e o Miguel estava animadíssimo. O filme não é recomendado para menores de 12 anos e acho que também estava evitando levá-lo por conta disso. Só que já tínhamos visto Malévola que também não é recomendado para menores de 12 anos. Miguel gostou do último mas sua felicidade não se comparava com a possibilidade de assistir ao filme que estava esperando. 

Pra minha surpresa, Miguel nem ameaçou dormir. O garoto ficou as quase 3 horas de filme super ligado, excitado, conhecia todos os robôs/transformers e mal esperava pra que chegasse a hora de aparecer os transformers/dinossauros. A carinha dele era a coisa mais fofa do mundo! E eu e Hugo olhávamos pra tela e pro rostinho dele, observando e nos enchendo com a energia e felicidade dele. Miguel, Hugo e eu curtimos muito. E naquele escurinho do cinema percebi que meu filho está quase um menino crescido, um menino que começa a dormir em filmes mais bobinhos. Um menino que fica com os olhos brilhando com dinossauros, robôs, super heróis e Harry Potter. 

Meu bebê gordinho está virando um menino que gosta de enfiar a mão do bolso da calça jeans quando está parado. Meu menino que gosta de jogar seu cabelo liso pra trás com a mão esquerda. Meu menino que gosta de piscar o olho pra mim quando entra na sala e estou sentada no sofá. Um menino que sobe a rampa da escola carregando sua mochila e que sabe que ficarei esperando no portão até ele chegar no alto, parar e me mandar um beijo. 

Nossa, como eu amo esse meu Miguel... Eu o amava também quando tinha que assistir a todos os vídeos da Galinha Pintadinha e dos Backyardigans, quando tinha que carregar uma bolsa pesando 5 quilos de tanta tralha, quando vez ou outra sentia um cheirinho de leite golfado no meu ombro. Amava o Miguel mesmo quando tinha sempre uma roupa extra pra mim e lencinhos umedecidos dentro da bolsa  ou quando tinha que acordar mil vezes por noite. Mas não dá pra negar que, mesmo que Transformers agrade muito mais ao pai que a mim, esse Miguel está muito mais gostoso e mais fácil de acompanhar!

sábado, 2 de agosto de 2014

Cupcake



Sempre acreditei que amizade se vê nas atitudes. Não falo o quanto gosto dos meus amigos o tempo todo, mas faço tudo o que posso para ajudá-los. Amigos me pedem de tudo, desde ajudá-los a preencher formulários, escolher roupas e programar viagens até ir junto ao médico e consolar das agruras da vida. Enfim, procuro estar sempre disponível, nem que seja pra emprestar o ouvido ou o ombro quando preciso. E, por mais que alguns acreditem na fórmula "sou seu amigo e preciso falar com você todo dia e lhe contar tudo o que acontece na minha vida", isso não rola pra mim. Estarei presente quando meus amigos precisarem. Não, não vou ficar telefonando toda hora.

Apesar desse meu jeito pouco carinhoso de ser, sou presenteada com atitudes muito fofas dos meus amigos e, às vezes, surpreendo-me com pessoas com as quais não tinha tanta convivência e nem intimidade. Conheci a Renata porque ela era esposa de um dos grandes amigos do Hugo. E esse ano, no meio de um terremoto em sua vida, nos aproximamos. Em uma situação adversa, quando a maior parte das pessoas foge e não quer escutar o que a pessoa que sofre tem a dizer, eu fiquei ali, disponível pra ela. E acabei ganhando uma amiga. A Renata, que sempre foi muito atenciosa e carinhosa comigo, tornou-se amiga quando passava por, talvez, o pior momento de sua vida. Na dor, aprendemos a ser amigas. E por termos nos aproximado em um momento complicado, sei que essa amizade chegou pra ficar. 

Vocês devem estar se perguntando: onde entra o cupcake nessa hora? Calma, vou chegar lá. 

Todo mundo sabe que meu filho é uma mistura de Paula e Hugo. Ao mesmo tempo que é falante e social, tem um lado forte geek do pai. Ele fica fuçando no YouTube os lançamentos de brinquedos e filmes e, vira e mexe, está assistindo a uns videos de um menino que mostra como funciona esse ou aquele brinquedo (normalmente brinquedos que ainda não chegaram no Brasil pra dificultar minha vida!). Outro dia, esse danado desse garoto dos videos, não devia ter o que fazer e resolveu mostrou como fazer um cupcake e daí que o Miguel passou a me encher o saco porque queria que eu fizesse cupcake pra ele comer. Gente, me pede um bolo mas não me pede cupcake. Eita bolinho que dá trabalho pra fazer é esse tal de cupcake! Expliquei pro Miguel que fazer não ia, mas que poderia comprar uns cupcakes pra ele comer. Miguel mostrou claramente que preferia que eu fizesse os bolinhos, mas aceitou que eu os comprasse. Fazer o quê, né?

Enfim, liguei pra Renata porque se tem uma pessoa antenada com tudo o que diz respeito a festas, é ela. Tem bom gosto e tem sempre um fornecedor de tudo o que você sonha em precisar. Prontamente, Renata me passou uns contatos pra eu satisfazer a vontade do meu menino. 

E aí é que entra o cupcake do título. Uma semana se passou sem que eu tivesse feito ainda a encomenda em uma das pessoas das quais Renata me passou o contato e Miguel continuava a perturbar querendo comer cupcake. Meu filho NUNCA esquece o que quer. Nunca, mesmo. Então, quando eu cheguei em casa depois do trabalho, como um milagre, lá estava um cupcake lindo, apetitoso, que havia sido deixado pela Renata na minha casa. Nossa, fiquei olhando pro bolinho pensando no tanto de carinho que vinha junto com aquele cupcake. Renata se importou com um capricho do meu filho, não esqueceu que o menino estava com desejo de comer um cupcake, desviou-se do seu caminho, seja lá pra onde estivesse indo, pra parar na porta da minha casa e deixar esse presente pro Miguel. Pra mim. E isso tem um valor imenso. São essas coisas que importam na minha vida, são esses gestos. Que bonito aquele cupcake, quanto significado...

Miguel devorou o cupcake e deixou que eu desse uma mordidinha apenas, depois de eu muito insistir com meu filho guloso. O cupcake estava muito, muito gostoso mesmo. Agora, posso dizer que minha amizade com Renata foi selada com açúcar. Pro Miguel, foi só um cupcake que apareceu pra matar sua vontade, trazido pela amiga da mamãe. Pra mim, foi cupcake com brigadeiro em cima e recheio de muito, muito amor.